Sobre Cabaré de Asfalto, por Moacyr Luz

Minha parceria com o Rogério Batalha nasceu na melhor manjedoura carioca - o subúrbio.

Para tropicalizar o fato, o primeiro aperto de mão foi sob a lona cultural de Vista Alegre, terra de Cláudio Camunguelo, um São Jorge disfarçado de flautista, com mão de estivador.

No dia seguinte, perdido num sofá longe dali, folheei o livro que ele havia me presenteado, poemas elogiados pelo craque baiano Waly Salomão, até esbarrar nos versos de Malícia.  Violão no colo saiu um samba-canção como se fosse combinado desde a rima principal  às propraroxítonas acentuações.

O repertório foi crescendo. Em comum, a solidão, mesmo diante de um engarrafamento na Avenida Brasil. Os carros buzinam, mas nada existe além do asfalto, tudo é delírio.  Brinco que seu nome é destino, batalha, feito essas previsões astrológicas, saturno, lua em escorpião, ascendente poeta. As músicas saltando feito naipes nas mangas de um mágico empolgado, cuspidas tal qual o fogo na boca da odalisca. Assim como as cartas de amor, elas, as canções,  precisavam de um coração. Apontando pro Norte, o imã encantado treme na direção dos flamencos, os "tempranilos" sinônimos  de uma rubra paixão chamada Viviani Godoy. Os olhos quase transparentes, enxergaram nesse balaio de acordes urbanos, palavras de sobrenados ou muros pichados, uma identidade. Levou entre os dedos até o fundo da garganta e batizou o som que emitiu de Cabaré de Asfalto. Pra mim, uma honra sem fim, assistir do balcão, depois de doses de incertezas, um trabalho que, modestamente, mantém os frutos da nossa arte repletos de sementes, dissonantes ou populares, mas música brasileira.